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A Química da Saúde

Capítulo 4, "A Caixa de Ferramentas de um Químico"

Para muitos, a palavra químico invoca imagens de baforadas de vapor rodopiando através de balões de vidro de laboratório onde borbulham líquidos incandescentes, brilhantes e coloridos. Este cenário é, talvez, gráfico, mas uma imagem mais exata da caixa de ferramentas de um químico de hoje em dia poderia incluir equipamentos como computadores, microscópios e grandes recipientes com bactérias fermentadoras.

A química do passado apresenta apenas uma ténue semelhança com atividade atual. Na realidade, a demanda de conhecimento — compreender como e porque é que as moléculas se combinam e recombinam de espantosas formas — mantém-se na mesma. Mas a química, a biologia, e mesmo a física são campos de estudo que estão a extravasar os seus limites. Os biólogos usam a magia dos lasers da física para observar o movimento das moléculas. Os físicos criam radioisótopos únicos que duram apenas minutos ou horas (ao contrário de muitos que se mantêm durante séculos) e que funcionam como ferramentas perfeitas para os investigadores seguirem moléculas nos organismos de animais e de humanos. Os biólogos e um número crescente de químicos usam organismos vivos — sistemas modelo, como bactérias e leveduras — para explorar os mistérios moleculares da saúde e da doença.

Cientistas na área da biomedicina — químicos, biólogos, bioquímicos e muitos outros — estudam problemas relacionados com a saúde que podem, em princípio, não ter uma ligação evidente com uma doença específica. Esboçar hipóteses e testá-las sucessivamente é muito trabalhoso. Muitas experiências "falham", no sentido de que o palpite do cientista acaba por estar errado. Mas cada falha é, por si só, um sucesso: um pedacinho de informação essencial que permite orientar o olhar treinado do ou da cientista numa direção um pouco diferente, em que ele ou ela podem voltar a testar uma ideia através de um conjunto de condições ligeiramente distintas. Para muitos cientistas, este processo contínuo é viciante!

Utilizando modelos, os investigadores podem realizar testes e novos testes com sistemas (como microrganismos, plantas, animais ou computadores) que possuem um conjunto de características definidas que não se modificam muito frequentemente de dia para dia, ou de experiência para experiência. Notavelmente, muitas criaturas que são menos evoluídas do que os humanos utilizam moléculas e vias semelhantes nas suas funções vitais. Um exemplo é a amilase, uma enzima na tua saliva que decompõe o amido em açúcares mais simples. No fabrico do pão, a amilase é "alimento" para leveduras, que utilizam esta enzima para as ajudar a produzir dióxido de carbono, o gás que faz a massa crescer. Em muitos casos, se uma determinada enzima ou via é muito semelhante em diversos organismos, há uma forte probabilidade de se tratar de uma molécula ou via metabólica importante — frequentemente indispensável à vida.

 

Uma Célula Modelo

Traditional chemistry lab equipment consisted of glass beakers,
      clamps, and tubing.
O equipamento tradicional de um laboratório de química consistia em frascos e balões de vidro, pinças e tubos.

Uma barreira protetora denominada por membrana plasmática (ver Forma e Função) é um dos locais de regulação mais importantes de uma célula, servindo como via de entrada e de saída a um conjunto de moléculas grandes e pequenas que são transportadas até à célula através da corrente sanguínea. Para funcionar adequadamente, as células necessitam de um constante aporte de nutrientes, eletrólitos e materiais estruturais. Enquanto alguns destes componentes indispensáveis são produzidos no interior da célula, muitos são obtidos a partir do exterior. A membrana plasmática é também um importante centro de comunicação, filtrando mensagens enviadas por outras células e pelo ambiente exterior. As membranas estão cravejadas de proteínas denominadas canais e poros que vão desde o exterior até ao interior da célula, e vice-versa. Os cientistas estudam frequentemente estas proteínas porque elas são um alvo importante para os medicamentos.

Os cientistas desenvolveram moléculas suficientemente "espertas" com auto-montagem em componentes celulares — tal como a membrana plasmática. E alguns investigadores estão a criar em laboratório pequenas estruturas.

M. Reza Ghadiri do Scripps Research Institute desenvolveu um método que permite que anéis e cordões de aminoácidos feitos em laboratório se organizem por si mesmos em canais tubulares e poros. Para criar os tubos, Ghadiri constrói anéis de oito a dez aminoácidos. Alterando um pouco as condições de reação, tal como o pH do líquido do tubo de ensaio, Ghadiri consegue que os anéis se empilhem uns em cima dos outros, formando um tubo. Estas versões artificiais de moléculas que existem naturalmente podem ser uma ferramenta extraordinariamente útil para os cientistas desenvolverem — e, em último grau, descarregarem — medicamentos no local exato do organismo. Por exemplo, ajustando as dimensões das unidades das cadeias anelares de aminoácidos, Ghadiri consegue desenvolver canais para transportar substâncias de diversos tamanhos, desde moléculas de água com três átomos até moléculas de açúcares consideravelmente maiores, como a glicose. Aquelas moléculas também poderiam ser usadas como antibióticos, ao abrirem canais artificiais nas membranas bacterianas — tornando-as demasiadamente porosas para conservar o seu conteúdo.

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Insetos de Laboratório

Squash beetle
As joaninhas são laboratórios químicos sofisticados.
Thomas Eisner

No que se refere à utilização de organismos modelo, o químico Jerrold Meinwald da Cornell University, Ithaca, Nova Iorque vai na dianteira de muitos cientistas: Ele seleciona criaturas que gerem os seus próprios laboratórios químicos. Os insetos comunicam — com outros insetos, com plantas e com o seu ambiente em geral — através de meios químicos, exsudando uma série de substâncias diferentes, tais como venenos tóxicos e atrativos sexuais. Meinwald e Thomas Eisner, colaborador em Cornell de longa data, descobriram que uma variedade de insetos, as joaninhas, produz de forma constante, uma grande variedade de compostos químicos — alguns com enormes anéis moleculares — apenas a partir de algumas unidades estruturais químicas. Ainda mais espantoso é o facto de estas secreções químicas — que aparecem sob a forma de "gotículas defensivas" em minúsculos pelos na superfície da imatura e não móvel larva da joaninha — modificarem-se continuamente (através de ligeiras alterações de ligações ajustáveis entre átomos associados) de forma a criar ainda mais moléculas. Meinwald suspeita que muitos destes mecanismos feitos pelos insetos servem em geral como defesa contra predadores, mas a maioria não foi, ainda, analisada no laboratório.

 

Isto é Química Orgânica?

Two giant vesicles are about to fuse.
Duas vesículas gigantes prestes a fundir-se.
Jason Keiper

Uma abordagem semelhante, seguida por Frederic Menger da Emory University, Atlanta, consiste no desenvolvimento e produção de "vesículas gigantes", que de certo modo se assemelham a células artificiais. Menger é capaz de fazer vesículas — basicamente, bolhas grandes revestidas por uma membrana — praticamente do mesmo tamanho de uma célula, e com propriedades celulares feitas à medida. O seu trabalho inovador é mais um exemplo de quão pouco nítidas se tornaram as linhas clássicas entre a química e a biologia. Antes de os alunos de doutoramento de Menger poderem começar a estudar a função celular — tradicionalmente uma finalidade biológica — têm que demonstrar ser peritos em química orgânica sintética. Menger assegura que esta capacidade — a mestria de utilizar química para produzir, a partir de unidades simples, uma multiplicidade de equivalentes biológicos — mostra-se muito útil para perceber processos celulares fundamentais.

Na maioria das suas experiências com vesículas, Menger coloca um material gorduroso (um lípido designado por DDAB, brometo de didodecildimetilamónio) em água. Quase instantaneamente, o líquido oleoso agrega-se, organizando-se em esferas. Apesar de muito pequenas, do ponto de vista de um químico elas são gigantes — quase do tamanho de uma célula (algo que é facilmente observável com um microscópio convencional). Se se vai utilizar as vesículas para colocar questões acerca de células, diz Menger, é essencial fazer as esferas com, aproximadamente, esse tamanho (para que o ângulo de curvatura da "membrana" se assemelhe o mais possível ao de uma célula). Mas a verdadeira vantagem de fazer as bolas de lípidos tão grandes é que Menger pode usar um microscópio e observar o que se passa com elas — em tempo real — à medida que lhes fornece outros químicos e hormonas ou as submete a rápidas alterações térmicas. Menger espera que estas experiências químicas pouco comuns contribuam para compreender problemas biológicos, nomeadamente como as células de tumores se ligam entre si, como é que membranas gravemente danificadas (como no caso de queimaduras ou feridas) se reparam e mesmo como ocorre a fusão de gâmetas na fertilização. E, uma vez que as membranas celulares são o normal local de entrada para uma diversidade de medicamentos, o trabalho também pode conduzir a melhores mecanismos de direcionamento de medicamentos.

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Quem é o Anfitrião Desta Festa?

Illustration of plasma membrane

Milhões de anos de seleção natural criaram articulações perfeitas entre companheiros de equipa biológicos, como os recetores e as proteínas que estes reconhecem: enzimas e os seus substratos, por exemplo, ou duas cadeias de DNA complementares. Contudo, ao começar a partir do nada no laboratório, os químicos têm que trabalhar arduamente para criar um recetor apropriado para uma molécula conhecida ou para uma nova que nem sequer existe na natureza. Em química supramolecular, um campo de investigação de complexos químicos constituídos por moléculas que se reconhecem e encaixam pretende desenvolver métodos que permitam estudar — e mesmo criar — interações entre duas moléculas que encaixam, simulando ou bloqueando uma função que ocorra naturalmente. Frequentemente, os recetores são entidades biológicas conhecidas. Um exemplo pode ser o recetor de uma hormona. No teu organismo, estes recetores estão ligados a outros recetores através de vias bioquímicas, pelo que a ativação de um desencadeia uma imparável cascata de reações que resultam numa resposta fisiológica, tal como uma alteração na tua pressão sanguínea. Para interromper estas vias — envolvidas, por exemplo, em doenças cardíacas ou em cancro — os cientistas estão a tentar desenvolver recetores/bloqueadores sintéticos que se conseguem ligar firmemente à sua molécula liganda, impedindo-a de comunicar com outras proteínas (os seus verdadeiros recetores). Uma estratégia deste tipo tem o potencial de alterar uma via de sinalização completa. Os químicos usam modelos em computador assim como todo o conhecimento específico disponível sobre o comportamento e as formas das moléculas para produzir à medida estes equivalentes.

 

Um Quarto Sem Grande Vista

Two flaps of this 'softball' molecular cage open up to expose a
      molecule called adamantane (in center) to other incoming reactants.
Duas abas desta gaiola molecular "tipo bola de ténis" abrem, expondo uma molécula denominada adamantano (no centro) a outros reagentes vindouros.
Reproduzido com permissão de Julius Rebek, Javier Santamaria e Michael Pique (Scripps Research Institute)

A imitação de constituintes celulares para estudar reações químicas em contextos biológicos é uma área importante da investigação química atual. Deste modo, os cientistas podem induzir alterações muito ténues que podem nem sequer existir na natureza e testar os resultados fisiológicos destas modificações. Para além da produção de componentes celulares, alguns químicos investiram na criação de espaços sub-microscópicos feitos à medida nos quais as reações podem ocorrer. Estes espaços não são muito amplos, mas fornecem exatamente o espaço suficiente para apenas um par de moléculas de uma forma definida. Julius Rebek do Scripps Research Institute é um perito na produção destas gaiolas moleculares, que, em alguns casos, poderiam facilitar aos cientistas o estudo de reações bioquímicas em laboratório.

O mais interessante é que Rebek dedica pouco tempo a construir estas gaiolas moleculares — elas auto constroem-se. Rebek fornece as armações de átomos que podem ser preparadas a partir de receitas químicas relativamente simples. Depois, as forças químicas de atração colam as peças da gaiola umas às outras, de forma muito semelhante à união das costuras de uma bola de ténis. As gaiolas são centros de reação ideais. Rebek aprisiona outras substâncias químicas no interior das gaiolas, para que essas moléculas sejam forçadas a entrar em contacto umas com as outras e reagir. À medida que a reação prossegue, os produtos ficam também contidos, podendo ser extraídos posteriormente. O processo é semelhante ao que se verifica com reações catalisadas por enzimas, nas quais a principal função da enzima consiste em posicionar as substâncias químicas que reagem de forma a ficarem próximas entre si. Para além de atuarem como enzimas, as gaiolas moleculares — que podem ser formadas repetidamente e de forma reversível — podem ser utilizadas como aparelhos de perceção biológica, programados para detetar apenas as moléculas que têm uma determinada forma.

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Laboratório-Num-Chip

This lab-on-a-chip contains an expansive network of
      miniature tubes and columns, each the size of a tiny fraction of a drop of water.
Este laboratório-num-chip contém uma extensa rede de tubos miniaturais e colunas, cada uma do tamanho de uma pequena fração de uma gota de água.
Cortesia de Fred Regnier.

Imagina um chip, ...de silício, plástico e vidro… do tipo que cabe perfeitamente entre as pontas dos dedos... e que contém um laboratório cheio de instrumentos! É verdade — o químico da Purdue University, Fred Regnier, conseguiu criar um destes "laboratório-num-chip" contendo extensas redes de tubos miniaturais e colunas de separação Liliputianas, tudo metido num prensado de silício do tamanho de uma moeda, através das mesmas técnicas utilizadas para produzir chips de computador. A aplicação de carga elétrica às extremidades do chip resulta na condução de uma amostra líquida através da tubagem, onde entra em contacto com vários mini instrumentos, tais como tubos de ensaio do tamanho de partículas de pó e colunas de cromatografia (câmaras que separam os componentes de uma mistura) da espessura de um cabelo. O pequeno chip-laboratório utiliza significativamente menos matéria-prima, necessitando de uma quantidade de líquido um milhão de vezes menor do que os instrumentos de tamanho normal — uma quantidade que equivale a apenas uma fração de uma gota. E, para além de poupar espaço de trabalho, os chips também permitem poupar tempo ao possibilitar a realização de várias experiências simultaneamente. Propriedades como estas podem, um dia, tornar esta tecnologia ideal para quantificar múltiplos componentes de uma solução — colesterol, açúcar e eletrólitos no sangue, por exemplo — no consultório de um médico.

Outros cientistas estão a desenvolver chips semelhantes para serem usados como cápsulas de libertação de medicamentos. Uma "farmácia-num-chip" deste tipo, concebida pelo engenheiro químico Robert Langer do Massachusetts Institute of Technology está ainda em fase de desenvolvimento. O chip de Langer — também um prensado de silício do tamanho de uma moeda — contém algumas dúzias de minúsculos reservatórios. Os poços das amostras, como estes reservatórios são designados, têm capacidade para um volume menor do que um grão de sal. Os poços são forrados por uma membrana de ouro e carregados com várias soluções (na fase de teste, os investigadores, carregaram compostos fluorescentes que seriam facilmente detetáveis após serem libertados). Os reservatórios são então selados com vidro. Langer e os seus colegas formulam uma solução que simula fluido corporal (no que se refere a pH e a conteúdo de eletrólitos), mergulham o chip neste líquido e aplicam corrente elétrica através dos elétrodos na parte superior dos poços. Depois, a química acontece! Partículas de ouro associam-se a moléculas de cloreto da solução e formam aquilo que os químicos designam por sal: um par de moléculas com cargas opostas. Resultado: a membrana de ouro de cobre os poços colapsa e o conteúdo do poço — por exemplo, uma substância química — é libertado para a solução.

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Anticorpos Aplicados

Catalytic antibodies can act like enzymes, converting
          reactants into products.
Os anticorpos catalíticos podem atuar como enzimas, convertendo reagentes em produtos.
Adaptado com permissão de Trends in Cell Biology 1999, 9, M24-M28. Copyright 1999 Elsevier Science.

A primeira coisa em que muitos pensam quando ouvem a palavra anticorpo é "algo que existe no meu organismo e que me ajuda a combater uma constipação ou a gripe." No teu organismo, essa é, de facto, a principal função dos anticorpos. Feitos à medida pelo teu sistema imunitário, os anticorpos curam-te começando por identificar — e de seguida supervisionar a destruição de — microrganismos que fazem com que fiques doente. Melhor ainda, da próxima vez que essa molécula ou organismo aparecer vais ter os anticorpos preparados, à espera de entrar em ação. Talvez o aspeto mais impressionante dos anticorpos seja a sua versatilidade. Na realidade, qualquer molécula estranha pode desencadear a produção de um anticorpo específico que lhe corresponde, pólen, toxinas bacterianas, DNA. Para por um minuto e pensa quão sofisticado deve ser o teu sistema imunitário para ter a capacidade de produzir anticorpos perfeitamente específicos para uma tão grande variedade de moléculas com que pode entrar em contacto! Os químicos conseguiram mobilizar o extraordinário poder do nosso sistema imunitário produtor de anticorpos, para explorar problemas fundamentais em química. Por exemplo, foram produzidos anticorpos contra complexos moleculares que se formam ao longo de uma reação química. Estes complexos — que os químicos designam por estados de transição — são como uma fotografia molecular daquilo que acontece durante a fase mais importante de uma reação química. É possível preparar aquilo que se designa por anticorpos catalíticos, que influenciam efetivamente — acelerando ou bloqueando — uma determinada reação química que os cientistas queiram estudar.

 

As Muitas Caras do DNA

DNA — já não é apenas para a hereditariedade. O ácido desoxirribonucleico, cuja função primordial consiste em ser passado sob a forma de genes de pais para filhos, é, na sua essência, uma coleção de moléculas — uma substância química. Os cientistas estão a explorar algumas das características únicas desta versátil substância e, deste modo, o DNA está a adquirir novas utilizações. No futuro, aparelhos eletrónicos contendo DNA terão o potencial de trabalhar mais rapidamente e de caber numa ínfima fração do espaço necessário às máquina atuais. Antevê-se que mini máquinas baseadas em DNA sejam também extraordinariamente eficientes, consumindo menos energia e libertando menos calor do que o equipamento utilizado rotineiramente. Muitas propriedades do DNA — o seu tamanho, a sua estrutura e as regras que determinam o modo como é copiado — podem valorizá-lo em relação a outros materiais para uma diversidade de finalidades. Por exemplo:

Os Mini Cabos Elétricos do DNA

DNA can conduct electricity.
O DNA é capaz de conduzir eletricidade.
Cortesia de Jacqueline Barton.

Os cientistas sabem, há meio século, que o DNA nos nossos organismos — e em microrganismos, plantas e animais — tem uma estrutura especial (designada por dupla hélice) que se assemelha bastante a uma escada em espiral. As duas metades da escada são complementares — elas ligam-se uma à outra à semelhança do que acontece com o Velcro®. Cada corrimão da escada é constituído por moléculas em anel de açúcar ligadas entre si por grupos fosfato, os degraus são formados por moléculas em anel conhecidas por bases púricas e pirimídicas. O conjunto de cada açúcar mais um grupo fosfato mais uma base constitui um nucleotídeo. Os degraus são as letras no código da vida e formam a sequência alfabética de cada gene. Devido à organização ordenada de tudo isto, as cadeias de DNA têm propriedades elétricas definidas. Conjuntos de moléculas em anel exibem arranjos ordenados de eletrões e formam aquilo que os cientistas designaram criativamente por "ligações pi". (Os denominadas orbitais pi são regiões ocupadas por eletrões que pairam sobre os átomos e são particularmente comuns em redor das ligações nas moléculas em anel.) Os cientistas descobriram que os eletrões conseguem, literalmente, saltar ao longo destas vias. Cientistas como Jacqueline Barton do California Institute of Technology, que estuda a condução de eletricidade no DNA, suspeitam que danos no DNA podem ser provocados — ou talvez até corrigidos — pela transferência de eletrões através do DNA. Em termos mais práticos, cabos elétricos de DNA poderiam ser componentes úteis em máquinas miniatura.

Mini Robots de DNA

Rotation between two naturally occurring shapes
          of DNA (B and Z) causes this tiny robotic arm to move back and forth.
A rotação entre duas formas de DNA que ocorrem naturalmente (B e Z) resulta no movimento deste pequeno braço robótico para trás e para a frente.
Cortesia de Nadrian Seeman.

Algumas das fábricas do futuro vão ser muito mais pequenas do que as do presente. Isto porque estas unidades de produção vão ter na sua equipa de trabalho minúsculos robots, não humanos, para desempenhar tarefas rotineiras e repetitivas. Nadrian Seeman da New York University, Nova Iorque, utilizou cadeias de DNA preparadas em laboratório para construir o primeiro aparelho nano mecânico baseado em DNA. (O prefixo nano significa um milésimo de milionésimo, pelo que um objeto que tenha 1 nanómetro tem um milimilionésimo de um metro). Seeman começou com uma molécula de DNA sintética, que designa por DX DNA, cuja forma é muita rígida. Esta propriedade torna-a um braço robótico ideal. Seeman utilizou enzimas que ligam as unidades estruturais de DNA, de forma a obter um conjunto de três peças de DNA diferentes, cada uma das quais terminando em laço. As junções dos componentes da mini máquina são curvas e contracurvas que ocorrem naturalmente no DNA. O minúsculo nano aparelho de Seeman é demasiado pequeno para se conseguir ver, mesmo com um microscópio. Assim, para medir as distâncias entre as partes de DNA que se ligam e para assegurar que o aparelho é construído conforme o previsto, Seeman marca cada uma das partes com uma etiqueta fluorescente e procura informação nos brilhos que ocorrem quando as moléculas estão próximas entre si (ou que não ocorrem quando estão afastadas).

Biossensores de DNA

Rotation between two naturally occurring
          shapes of DNA (B and Z) causes this tiny robotic arm to move back and forth.

No futuro próximo, o DNA será utilizado como um material versátil a partir do qual os cientistas podem construir biossensores, mecanismos que detetam a presença de algo biológico — por exemplo, uma pequena quantidade de DNA num vírus — e emitem um sinal. Os biossensores de DNA podem ser, teoricamente, utilizados em diagnósticos médicos (por exemplo, detetar um erro num gene associado a uma doença), em ciência forense, na agricultura ou mesmo em processos de limpeza ambiental. Uma vantagem significativa de mecanismos de deteção baseados em DNA resulta de não ser necessária monitorização externa. Como funcionam? Os biossensores de DNA são mini máquinas complicadas — constituídas por elementos de deteção (“sondas”, que são complementares à sequência de DNA a ser detetada), microlasers e um gerador de sinal, tudo em um. A função do biossensor de DNA baseia-se no facto de duas cadeias de DNA se ligarem através de forças de atração químicas. Num sensor deste tipo, apenas uma combinação exata — ou seja, duas cadeias que encaixam em cada nucleotídeo — dá origem a um sinal fluorescente (um brilho) que é então transmitido a um gerador de sinal. Em teoria, o sensor poderá ser uma pequena fração de um chip que, mergulhado num líquido de teste — sangue, por exemplo — permitirá detetar indícios de bactérias ou vírus patogénicos.

Computadores de DNA

A DNA computer can solve extremely difficult math problems.
Um computador de DNA pode resolver problemas matemáticos extremamente difíceis.
Adaptado com permissão de Tomo Narashima.

Os cientistas desenvolveram o primeiro protótipo de computador de DNA em 1994. Estes pequenos aspirantes a PC ainda não são populares, mas podem representar uma poderosa ferramenta para técnicos e biólogos resolverem problemas extraordinariamente complexos. Se pensares bem, computadores feitos de DNA fazem sentido. A Mãe Natureza selecionou o DNA como o transportador da vida por uma boa razão. O DNA é estável e previsível — cadeias intactas do material genético foram encontradas em espécimes com milhares de anos. Um conjunto de regras matemáticas define como o DNA é transmitido através de gerações. E, para além disso, o DNA é capaz de auto-duplicação — consegue copiar-se a si mesmo! Consideremos um problema da matemática famoso e de difícil resolução denominado o Problema do Caminho Hamiltoniano, no qual, dados alguns pontos — cidades, por exemplo — o objetivo consiste em encontrar o percurso mais curto desde a cidade de partida até à cidade final. Mas as regras determinam que só se pode passar uma vez por cada uma das cidades de passagem. Parece fácil, mas para os computadores convencionais é muito difícil encontrar a resposta, porque a única forma através da qual sabem resolver o problema é tentar todas as possibilidades, uma a uma. Com efeito, para aproximadamente 100 cidades, é necessário um super-computador, e para 1000 cidades, não há computador algum capaz de resolver o problema! Os computadores baseados em DNA, por outro lado, resolveriam este problema facilmente, uma vez que poderiam testar todas as hipóteses simultaneamente, em paralelo. Como poderiam fazer isso? Os cientistas fizeram "cidades" a partir de cadeias de DNA produzidas em laboratório (à semelhança de um gene, cada cidade de DNA tinha uma combinação distinta dos quatro nucleotídeos diferentes). De seguida, os investigadores produziram cadeias de conexão. Os comprimentos destes conectores, que estabelecem a ligação entre o final de cada cidade de DNA com o início de outra (várias cidades poderiam ser ligadas deste modo) foram definidos com base na distância entre as cidades. Os cientistas juntaram tudo e todas as cidades de DNA complementares se associaram em todas as combinações possíveis. Voilà! O cordão de DNA mais curto a formar-se é a resposta ao problema.

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Caixa de Questões: A Vida no Limite

Ninguém na minha família era cientista. Eu achei-a simplesmente fascinante. Eu gostava de biologia, mas adorava a precisão que a química pode fornecer.

A DNA computer can solve extremely difficult math problems.

A vida no limite pode ser muito interessante. Para a química Barbara Imperiali do Massachusetts Institute of Technology a fronteira entre a química e a biologia é, efetivamente, um limite desafiante e passível de beneficiar significativamente a saúde humana. Utilizando um kit de ferramentas de química, Imperiali é uma das muitas químicas atuais a tentar resolver mistérios biológicos. Um problema que Imperiali decidiu enfrentar é como determinadas proteínas com açúcares associados se deslocam em células compartimentadas (aquelas — como as células humanas — que possuem um núcleo e outros organelos), as quais, como ela descreve "têm a necessidade de um sério controlo de tráfego!". Imperiali concentra-se nas vias celulares responsáveis pela fixação de açúcares a proteínas e nessas próprias proteínas. Utilizando inovadoras estratégias de design, ela está a desenvolver proteínas artificiais a partir de unidades estruturais que não são utilizados pela Mãe Natureza. Ela também está a pressionar os limites da tecnologia ao desenvolver biossensores particularmente sensíveis que são capazes de detetar quantidades vestigiais de metais em fluidos biológicos. A Química da Saúde interrogou-a acerca dos tipos de ferramentas de que necessita para tornar estes tipos de experiências possíveis.

QS: Quais são algumas das mais excitantes tecnologias na interface química-biologia?

Imperiali: Na realidade, não existe uma técnica que se destaque. A tecnologia tem vindo a fazer grandes avanços nas últimas duas a três décadas. Agora estamos numa posição de aproximar todas as ferramentas a fim de investigar muito detalhadamente sistemas biológicos complexos.

QS: Que tecnologias são indispensáveis para o tipo de trabalho que desenvolve?

Imperiali: Espectroscopia de RMN (ressonância magnética nuclear), certamente. É uma técnica utilizada para observar a estrutura e o movimento das moléculas numa solução aquosa. É um dos métodos através dos quais testamos se as proteínas que concebemos fazem realmente aquilo que pensamos que fazem. Hoje em dia, a RMN é também muito valiosa em medicina, onde é conhecida como IRM (imagiologia por ressonância magnética) e está a ser usada para observar pessoas inteiras.

Outro bom método é a fluorescência, uma tecnologia que é extremamente sensível na deteção de quantidades vestigiais de amostras biológicas e pode mesmo ser usada para seguir proteínas no interior de células vivas!

Outra técnica fantástica é a espetrometria de massa. Com a "mass spec.", como é conhecida, podemos determinar instantaneamente a composição de pequenas quantidades de amostra — com outros métodos é necessário ter 10000 vezes mais material para analisar algumas amostras.

QS: Em que é que os laboratórios de química atuais diferem dos de há 10 ou 20 anos atrás?

Imperiali: Quando eu era estudante universitária, uma secretária, uma banca de laboratório e uma hotte eram o "meu território". Agora, os alunos têm uma secretária, mas deslocam-se no laboratório até diferentes bancadas para realizar as suas experiências. Também há uma maior associação de laboratórios. Isso acontece com frequência — é exatamente a escolha mais acertada quando se tenta abordar problemas interdisciplinares.

QS: O que é que desencadeou o seu interesse pela ciência?

Imperiali: Ninguém na minha família era cientista. Eu achei-a simplesmente fascinante. Eu gostava de biologia, mas adorava a precisão que a química pode oferecer. Eu estava entusiasmada com a observação de moléculas individuais e com a compreensão da função biológica, molécula a molécula.

QS: Aconselharia uma pessoa jovem interessada em ciência a seguir uma carreira de investigação em química?

Imperiali: Completamente, mas também lhes digo que devem escolher algo que apreciem verdadeiramente. Caso contrário, não valerá a pena. Eu tento dizer-lhes para aprenderem a pensar, em vez de aprenderem uma habilidade específica.

 

Compreendeste?

De que modo as gaiolas moleculares se assemelham a enzimas?

Dá três exemplos de miniaturas de chips biológicos utilizados atualmente por cientistas na investigação.

Enumera alguns exemplos de organismos modelo.

De que modo os investigadores utilizam a química supramolecular para estudar biologia?

Comenta as razões pelas quais é importante que os químicos trabalhem em colaboração com biólogos, físicos e outro tipo de cientistas.

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National Institutes of Health, Bethesda, MD
Revised 2005
Casa das Ciências
Traduzido e Adaptado
Outubro de 2011