O corpo negro     

Constante de Boltzmann     k = 1,380 650 3 × 10-23 J/K
Constante de Planck           h = 6,626 068 74 × 10-34 J.s
Velocidade da luz                 c = 299 792 458 m/s


1. Probabilidade de troca átomo-fotão

O fotão é um bosão, segue portanto a estatística de Bose-Einstein. A probabilidade de emissão de um bosão na presença de n bosões idênticos é proporcional a n+1  [Pe = (n+1) p]  e a probabilidade de absorção é proporcional a n  [Pa = n p]  (p: probabilidade de emissão do bosão sozinho).  *


2. Equilíbrio térmico do corpo negro

O corpo negro é constituído por uma cavidade oca com volume V à temperatura T, em equilíbrio térmico. Os átomos da parede absorvem os fotões presentes na cavidade e depois reemitem-nos. Oscilam portanto entre dois níveis de energia Ea e Ee, separados por ΔE = hν

Ne átomos estão no estado Ee e Na no estado Ea. A cavidade contém n fotões.
O número de fotões emitidos é portanto Ne Pe = Ne (n+1) p
e o número de fotões absorvidos é Na Pa = Na n p
Em equilíbrio térmico, estes dois valores são iguais, logo Ne (n+1) p = Na n p ou Ne (n+1) = Na n
Ora, em equilíbrio térmico, também Ne/Na = e -ΔE/kT (fórmula de Boltzmann),
logo: n/(n+1) = e -ΔE/kT e, portanto: n = 1/(e ΔE/kT -1) = 1/(e hν/kT -1)
A energia dos fotões de frequência ν é então Eν = n hν = hν/(e hν/kT -1)


3. Número de modos contidos no intervalo de frequência
δν

Num comprimento L, há uma onda estacionária de polarização dada se L = j λ /2 ou L = j π/kj, logo:  kj = j π/L   (j inteiro).
O intervalo entre dois números de onda sucessivos é então δk = π/L.
O número de valores de k compreendidos dentro de um intervalo  δk >> δk é então   δk /δk = δk L/ π
Porém, numa onda estacionária contendo duas ondas, o número de modos δM não é mais que a média do número de valores de k, logo:        δM = δk L/ 2π

A 3 dimensões, δM = δMx δMy δMz =  δkx Lx/2π δky Ly/2π δkz Lz/2π = LxLyLz/(2π)3 δkx δky δkz
δM = V /(2π)3
δk3. Tendo o fotão dois estados de polarização possíveis, δM = 2V/(2π)3δk 3

δk3 é o intervalo de volume esférico no espaço dos k e vale portanto 4πk² δk.
Logo: δM = 8πV/(2π)3 k2δk  =  V/π2 k 2δk.    
k = 2πν/c logo: δM = 8π2/c3 δν


4. Energia volúmica do corpo negro

A cavidade contém δM modos, contendo cada um a energia Eν = hν/(e hν/kT -1) em cada intervalo de frequência δν
A energia contida no intervalo de frequência
δν é então δE = 8 π2/chν/(e hν/kT -1)   δν
dE = 8πVhν3/ (c3(e hν/kT -1) ) δν

Energia volúmica por intervalo de frequência dν: dE = δ E/V

          dE = 8
π3/ (c3 (e hν/kT -1) ) dν

Energia volúmica por intervalo de pulso

ν = ω/2π   logo: dν = dω/2π. Tem-se então dE = 16π2 hω 3/(c3 (e hw/kT -1) ) dω/16π4 = hω 3/(π2c3 (e hw/kT -1) ) dω com  h = h/2π

       dE = hω3/(π2c 3 (e hw/kT -1) )dω 

Energia volúmica por intervalo de comprimento de onda dλ

λ = c/ν ou ν = c/λ  logo: dν = (-) c/l2 dλ. Tem-se então dE = 8π hc3/(λ3 c3 (e hc/kλT -1) ) c/λ2 dλ .

        dE = 8π hc/(λ5(e hc/kλT -1) )


Lei de emissão do corpo negro (Lei de Planck)

Energia volúmica por intervalo de comprimento de onda

Curva dE/dλ = f (λ)

dE        8πhc                1              
---  =  ----  ------------
dλ          λ5
      ( e hc/kλT - 1 )   


5. Lei de Wien

A curva passa por um valor máximo quando  λ5 ( e hc/kλT - 1 ) passa por um valor mínimo.

Derivando em relação a λ:  5λ4( e hc/kλT - 1 ) - λ5 hc/(kλ2T )e hc/kλT = 0
Simplificando:
λ4  :  5 ( e hc/kλT - 1 ) - hc/(kλT )  e hc/kλT = 0  logo:  ( 5 - hc/(kλT )) e hc/kλT - 5  = 0
Considera-se hc
/(kλT) = u
( 5 - u ) e u  - 5  = 0
Considera-se 5 - u = x
então:  x e 5-x  = 5  logo:  x e 5 e -x  = 5  e, deste modo:  e 5/5  x  =  e x

Resta resolver esta equação, o que não é muito evidente de não for feito numericamente. .

A solução é o ponto de coincidência inferior das curvas y = e 5/5  x  e  y = e
que é aproximadamente y = 30 x   e   y = e x . Manifestamente, y é próximo de 1 e portanto x é próximo de 1/30.
Como x << 1, pode-se desenvolver e x na série de Taylor em 2a ordem:  e= 1 + x + x2/2
Logo: 1 + x + x2/2 = e 5/5  x 
x2 - 2( e 5/5 -1 ) x + 2 = 0
A solução é então: x = ( e 5/5 -1 ) - ( ( e 5/5 -1) 2 - 2 ) 1/2  = 0,03488552  (A determinação numérica dá 0,0348857682557236963, logo a aproximação é muito boa).
u = hc/(kλT = 5 - x = 4,9651142317442763037
λ = hc/( 4,9651142317442763037 kT ) = 2,8977686 × 10-3/T , é a Lei do deslocamento de Wien.


Lei de Wien

λmax  = 2897,77 × 10-6/T


6. Intensidade luminosa em função da frequência

A intensidade luminosa I é a potência luminosa por m² à frequência ν no interior do corpo negro.
É a energia produzida num segundo à frequência ν numa secção de 1 m², é portanto a energia contida num volume de secção 1 m² e de comprimento c: V = c
É portanto: I (ν) = V dE/ dν  = c dE/ dν = 8π3 / (c2(e hν/kT -1))        ou    I (ω) = c dE/dω = hω3/(π 2c2 (e hω/kT -1) )

       I (ν) = 8π hν3/(c2(e hν/kT -1))    ou    
       I (ω) = hω3/(π 2c2(e hω/kT -1))


7. Lei de Stefan-Boltzmann

A lei de Stefan-Boltzmann (ou lei de Stefan) dá a potência luminosa que sai de um corpo negro por uma superfície de 1 m².
Esta energia é o quarto da energia à frequência ν contida num volume V de secção 1 m² e de comprimento c.1s : V = c.
É então um quarto da intensidade luminosa à frequência ν.
Porquê um quarto? Porque metade da luz volta para trás e a luz que vem para a frente propaga-se em todas as direções, e tem portanto um fator cosseno que leva de novo a um fator de 1/2.
É então o integral em todos os ν da função  I(ν)/4  = 2π3/ (c2(e hν/kT -1))
P =  I(ν)/4 dν  =   3/(c2(e hν/kT -1))
Considera-se u = hν/kT, tem-se então I dν  =  2πh(kTu/h)3/c2 / (eu -1)  kT/h du  =  2πk4T 4/h3/cu3/(eu -1) du
logo: P = 2πk4T4/h 3 /c u3/(eu -1)du         pois       u3/(eu -1) du  =  π4/15, **
logo: P = 2π5k4/ (15 h3c2) T4  = σT4  (Lei de Stefan)
A constante de Stefan-Boltzmann: σ  =  2π5k4 /(15 h3c2) = 5,6703994 × 10-8 W m-2 K-4


Lei de Stefan-Boltzmann

P = σ T       s = 5,67040 × 10 -8 W m-2 K-4


8. Exemplos de aplicações

8.1 Determinação do albedo terrestre

O albedo é a proporção de energia luminosa solar que não é absorvida pela Terra, é refletida pela atmosfera.
Dados e medidas possíveis a partir da Terra:
        RT: raio da Terra
        RS: raio do Sol
        d: distância Terra-Sol
        θ: diâmetro aparente do Sol = 2RS/d = 32' = 9,308 × 10-3 rd
        TT: Temperatura média da atmosfera terrestre = -18 °C = 255 K (Viva o efeito de estufa!!!)
        TS: Temperatura da superfície do Sol
        lmax do Sol = 0,5014 µm

TS = 2,898 × 10-6max = 5780K   (Aplicação da Lei de Wien)
Potência emitida pelo Sol  P0 = 4πRS2σ TS4  (Aplicação da Lei de Stefan)
Potência recebida pela Terra  PS = P0 πRT2/4πd2 = P0 RT2/4d2 =  4πRS2σ TS4RT2/4d2 = πθ2σ TS4RT2/4
Potência emitida pela Terra  PT = 4πRT2σ TT4  (Aplicação da Lei de Stefan)
PT/PS = 4πRT2σ TT4 / (πθ2σ TS4RT2/4) = 16/θ2 ( TT/TS )4 = 0,689
Albedo a = 1- PT/P= 0,311      (Cerca de 30 % da energia recebida é refletida pela atmosfera.)


8.2 Determinação da perda de massa do Sol

Dados:
        RS: raio do Sol = 696265 km
        TS: Temperatura da superfície do Sol = 5780K
        Potência emitida pelo Sol  PS = 4πRS2 σ TS4  = 3,85 × 1026 W
        Massa perdida por segundo (relação de Einstein) = PS/c2 = 4,291 × 109 kg/s (mais de 4 milhões de toneladas por segundo!!)
Por outro lado, o Sol perde também cerca de 1 milhão de toneladas de matéria por segundo devido ao vento solar.

Massa perdida pelo Sol depois da sua formação (4,6 109 anos):
M = 5,3 × 109x 4,6 × 109 x 365,25 x 24 x 3600 = 7,7 × 1026 kg   (cerca de 128 massas terrestres, o que é muito pouco (0,038%) em relação à massa do Sol que é igual a 333432 massas terrestres. 



 Cálculo do integral de u3/ (eu -1)du

Sabendo que Σ qn = q/(1 - q ) = 1/( 1/q -1 ), tem-se 1/(eu -1)  =  1/(1/e-u -1) = Σ (e-u)= Σ e-nu  logo: 

u3/(eu -1)du  é igual a Σ ( u3e-nu )du  = Σ u3e-nu du 

Integrando três vezes por partes, tem-se então:
Σ 3u2 e-nu /n  du,  depois Σ -6u e-nu /n du,  depois Σ   6 e-nu /n3 du  que vale Σ 6/n= 6Σ 1 /n4  
então  Σ 1/n = π 4 /90, logo:  u3/(eu -1) du = π 4 /15


* Os puristas poderão inquietar-se pelo facto de uma probabilidade poder claramente ultrapassar 1! Será necessário normalizá-la. Na prática, não há lugar para essa preocupação dado que apenas se utilizam as razões das probabilidades.

 
    Traduzido e adaptado para a Casa das Ciências por Diana Barbosa e Manuel Silva Pinto em outubro de 2011