As Estruturas da Vida

Capítulo 5: Para além do design de medicamentos

Esta publicação tem-se centrado nas aplicações médicas mais imediatas da Biologia Estrutural. No entanto, os estudos detalhados das estruturas proteicas têm valor e potencial que vão muito além dos limites da indústria farmacêutica. Na sua base, esta investigação ensina-nos sobre a natureza fundamental das moléculas biológicas. Os exemplos mencionados de seguida dão um pequeno vislumbre das áreas e problemas que a Biologia Estrutural tem ajudado a esclarecer.
 

Contração muscular

Mesmo para movimentar o mais pequeno músculo, incontáveis moléculas proteicas de miosina (a azul e cinzento) têm que deslizar sobre filamentos de actina (a vermelho).
Mesmo para movimentar o mais pequeno músculo, incontáveis moléculas proteicas de miosina (a azul e cinzento) têm que deslizar sobre filamentos de actina (a vermelho).
Imagem retirada de Lehninger Principles of Biochemistry, de D.L. Nelson e M.M. Cox ©2000 (Worth Publishers); reproduzida com autorização.
Clique para ampliar.

A cada movimento que fazemos, desde um suspiro a uma corrida, espessos filamentos da proteína muscular miosina deslizam sobre finos filamentos da proteína actina nas nossas células. Estas proteínas também ajudam à divisão das células e permitem o seu movimento e mudança de forma – um processo essencial, quer para a formação de diferentes tecidos durante o desenvolvimento embrionário, quer para a disseminação de cancros. Já são conhecidas as estruturas detalhadas da miosina e da actina.

Voltar ao início da página

Transcrição e tradução

A estrutura da RNA polimerase (a azul e verde) mostra como esta lê o DNA (a laranja) e faz uma cadeia complementar de RNA (a rosa).
A estrutura da RNA polimerase (a azul e verde) mostra como esta lê o DNA (a laranja) e faz uma cadeia complementar de RNA (a rosa).
Imagem de David S. Goodsell, The Scripps Research Institute (para a "Molécula do Mês" do RCSB Protein Data Bank)
Clique para ampliar.

As células usam as instruções contidas no DNA para fazerem proteínas. Para cumprir esta tarefa, dezenas de moléculas (maioritariamente proteínas) aglomeram-se e separam-se em movimentos cuidadosamente cronometrados. As estruturas de muitas destas moléculas são conhecidas e têm permitido uma melhor compreensão da transcrição e da tradução.

Um exemplo chave é a RNA polimerase, uma enzima que lê o DNA e sintetiza uma cadeia complementar de RNA. Esta enzima é uma máquina molecular composta por dezenas de pequenas proteínas diferentes. Em 2001, Roger Kornberg, um cristalógrafo da Stanford University, determinou a estrutura da RNA polimerase em funcionamento. Esta estrutura cristalográfica sugeriu um papel distinto para cada uma das proteínas da RNA polimerase. Em 2006, Kornberg recebeu o Prémio Nobel da Química por este trabalho.

Voltar ao início da página

Fotossíntese

Este centro de reação fotossintética bacteriano foi a primeira proteína membranar cuja estrutura foi determinada. As espirais roxas (hélices alfa) mostram onde é que a proteína atravessa a membrana. Na orientação representada acima, a parte esquerda da molécula projeta-se à superfície da célula bacteriana, enquanto que a parte direita está dentro da célula.
Este centro de reação fotossintética bacteriano foi a primeira proteína membranar cuja estrutura foi determinada. As espirais roxas (hélices alfa) mostram onde é que a proteína atravessa a membrana. Na orientação representada acima, a parte esquerda da molécula projeta-se à superfície da célula bacteriana, enquanto que a parte direita está dentro da célula.
Cortesia de Alisa Zapp Machalek
Clique para ampliar.

"A fotossíntese é a reação química mais importante da biosfera, uma vez que é um pré-requisito para todo o tipo de vida superior na Terra", de acordo com a Fundação Nobel, que atribuiu o Prémio Nobel em Química em 1988 a três investigadores que determinaram a estrutura de uma proteína crucial para a fotossíntese.

Esta proteína, não de uma planta, mas de uma bactéria fotossintética, foi a primeira estrutura cristalográfica de raios-X de uma proteína embebida numa membrana. O feito foi extraordinário porque é muito difícil dissolver proteínas de membrana na água (um passo essencial para o processo de cristalização).

Para aprofundar ainda mais, a Fundação Nobel diz: "[Esta] determinação estrutural...tem uma importância química considerável muito para além do campo da fotossíntese. Muitas funções biológicas es-senciais além da fotossíntese...estão associadas a proteínas ligadas a membranas. Exemplos disso são o transporte de substâncias químicas entre células, a ação hormonal e os impulsos nervosos" – por outras palavras, a transdução de sinal.

Voltar ao início da página

 

Transdução de sinal

Os membros de uma família de moléculas, chamadas proteínas G, muitas vezes atuam como "condutores" de passagem de mensagens moleculares dos recetores proteicos para outras moléculas no interior da célula.
Os membros de uma família de moléculas, chamadas proteínas G, muitas vezes atuam como "condutores" de passagem de mensagens moleculares dos recetores proteicos para outras moléculas no interior da célula.
Cortesia do RCSB Protein Data Bank (http://www.pdb.org)
Clique para ampliar

Centenas, senão mesmo milhares, de processos vitais requerem a transmissão de um sinal bioquímico às células. Estes sinais podem ser hormonas, pequenas moléculas ou impulsos elétricos, os quais podem chegar às células através da corrente sanguínea ou de outras células.

Quando as moléculas-sinal se ligam aos recetores proteicos na superfície externa da célula, iniciam uma "cascata" de reações que envolvem muitas outras moléculas dentro da célula. Dependendo da natureza da célula alvo e da molécula sinal, esta cadeia de reações pode gerar um impulso nervoso, uma mudança no metabolismo celular ou a libertação de uma hormona. Os investigadores determinaram a estrutura de algumas destas moléculas envolvidas nas vias de transdução de sinal mais comuns.

Os recetores proteicos que se ligam à molécula sinal original estão por vezes embebidos na membrana celular externa, de modo que, tal como as proteínas envolvidas na fotossíntese, são difíceis de cristalizar.

Obter as estruturas de recetores proteicos, não só nos dá a conhecer mais sobre as bases da transdução de sinal, como também nos leva, de novo, à indústria farmacêutica. Pelo menos 50% dos medicamentos existentes no mercado tem como alvo proteínas recetoras – um alvo mais comum do que qualquer outro tipo de molécula.

Como esta publicação demonstra, um poderoso meio de aprender mais sobre a saúde, combater a doença e aprofundar o nosso conhecimento sobre os processos vitais é o estudo dos detalhes das moléculas biológicas – as extraordinárias estruturas da vida.

Voltar ao início da página

Compreendeste

Considerando o livro como um todo, como definirias a Biologia Estrutural?

Quais são os objetivos científicos dos investigadores que trabalham neste campo do saber?

Se fosses um biólogo estrutural, que proteínas ou sistemas estudarias? Porquê?

Traduzido e adaptado para a Casa das Ciências em setembro de 2013.
Tradução conjunta de Diana Barbosa e da equipa coordenada por José Pissarra (Maria Susana Jorge Pereira, Luís Gustavo de Carvalho Pereira,
Maria Fernanda Fidalgo Ferro de Beça, Armando Jorge Gomes Teixeira, Armando Jorge Gomes Teixeira e Fernando Manuel dos Santos Tavares).
Revisão científica de Maria João Guimarães Fonseca.